

DESTAK INTERNACIONAL, sexta-feira, 26 de Junho de 2015
Atravessamos o Atlântico, no sentido de encurtar distâncias entre dois povos irmãos, viemos ao encontro de uma atleta feminina de eleição do futsal brasileiro, chama-se Jéssica Cristina Frederico Spinola, ou apenas Jessiquinha no mundo do Futsal.
VC - Desde já agradecemos teres aceite o nosso convite para esta entrevista e começamos por perguntar-te em que altura e em que circunstâncias descobres esta tua paixão pela modalidade?
Jessiquinha - É um prazer dividir com vocês um pouco da minha experiência!!!
Quando criança brincava muito com o meu irmão e uma das brincadeiras que eu mais gostava era jogar bola, jogávamos o dia inteiro e foi com ele que aprendi a jogar!!! Era sempre eu jogando no meio dos meninos e com certeza isso facilitou muito o meu aprendizado!!! E desde então já tinha noção que era isso que queria para a minha vida!!!
VC – Como foi a aceitação dos teus pais e colegas de escola, pelo teu gosto pela bola, em detrimento de bonecas, como é normal numa menina?
Jessiquinha - Meus pais sempre me apoiaram, essa foi a minha sorte!!! Hoje só consegui conquistar meus os objetivos porque tive uma base familiar muito forte, se não fosse a minha família não sei se teria chegado até onde cheguei, e realizado alguns sonhos. A Minha família foi, e vem sendo essencial no meu crescimento como pessoa e atleta.
Sobre os meus amigos e colegas alguns me apoiavam, me chamavam em casa para jogar, falavam para seguir em frente pois tinha futuro e outros tinham preconceito dizendo que jogar bola era somente para homens e mulher tinha que pilotar o fogão!!!! Mas essas palavras eram pequenas diante do grande sonho que sempre tive, ser jogadora de futsal profissional e chegar a seleção brasileira.
VC – Em que clubes fizeste a tua formação e quais as pessoas que destacarias, neste processo de crescimento da jogadora e da “Mulher”?
Jessiquinha - Em primeiro lugar destaco DEUS, minha família e alguns amigos que sempre estiveram do meu lado me dando força e me motivando para superar cada obstáculo que surgia.
Sobre a minha formação, tenho muitos treinadores que me ajudaram a crescer não só como atleta mas também como pessoa. Digo desde o meu primeiro jogo do colégio interclasse, o meu primeiro treino na escolinha, o meu primeiro campeonato dos jogos escolares, o meu primeiro jogo como profissional, até chegar o meu primeiro jogo na seleção brasileira.
Todos com uma grande importância para o meu crescimento. Mas aonde aprendi a ver o futsal de forma diferente, jogar em conjunto, correr certo na quadra, ler o jogo de forma inteligente e em base disso usar as minhas maiores características cito os seguintes nomes: Treinadora Magali ( Clube Atlético Juventus), Marcelo Frigerio (Treinador da Unisant’Anna /Osasco e Seleção Paulista), Fernando Cabral (São Caetano Futsal), Vander Iacovino (Treinador da Seleção Brasileira) e Marcos Sorato ( Treinador da Seleção Brasileira), volto a dizer todos treinadores que trabalhei até hoje de alguma forma contribuíram para o meu crescimento.
VC - Fala-nos do teu percurso nesta modalidade enquanto sénior, uma caminhada cheia de títulos e sucesso?
Jessiquinha - Comecei jogando na rua com o meu irmão e amigos .Na escola Nilo Peçanha no ensino fundamental I, disputei campeonatos internos. Quando completei 8 anos de idade pedi ao meu pai de presente de aniversário para que ele me colocasse em uma escola de futsal, ele atendeu o meu pedido e joguei na escolinha chamada Salb durante alguns anos . Em seguida fui chamada para jogar no Atlético Clube Juventus com 9 anos de idade e foi aí que a minha vida começou a mudar pois estava em um clube de tradição, comecei a me profissionalizar e fui federada. No ensino fundamental II, fui convidada a estudar em uma das melhores escolas da região chamada Jacomo Stavalle, sempre foi muito difícil conseguir vaga nessa escola, mas felizmente através do futsal consegui, joguei diversos campeonatos escolares na qual fomos campeãs de praticamente todos os campeonatos, tínhamos um time muito bom e fui crescendo e ganhando espaço no meio do futsal, a cada jogo ficava mais conhecida, recebi muitos convites para jogar em diversas equipe, aceitei jogar pela Unisant’Anna/ Osasco e na época não tinha noção do tamanho da responsabilidade que estava assumindo, iria fazer parte de um dos melhores times do Brasil e ser treinada por um dos maiores técnicos de futsal feminino ao meu ver até hoje, mais conhecido como Tchelo. Depois de grandes conquistas fui convocada para a Seleção Paulista de Futsal e Futebol. Assim fui crescendo e sendo reconhecida por muitos, em 2007 fui convidada para jogar no Corinthians/Osasco, aceitei o convite e nesse mesmo ano tive a felicidade de ser convocada para a Seleção Brasileira na qual fiz parte durante 5 anos, conquistei todos os títulos que disputei pela seleção, hoje posso dizer que sou Bi Campeã Mundial e Tri Campeã do Sul-Americano e para mim foi uma honra e um grande sonho realizado. Em 2008 nosso time mudou de camisa e passamos a jogar pelo Palmeiras/Osasco, na qual fomos campeãs diante de uma das competições mais importantes que existe no Brasil, a famosa Taça Brasil que é um campeonato disputado por diversos clubes do Brasil inteiro e fomos Vice da Liga Nacional. Depois de 4 anos no Palmeiras, tive passagem pela equipe de Jacaréi (interior de São Paulo) , Governador Valadares (time de Minas Gerais), São Caetano (São Paulo), Seleção Brasileira Universitária na qual fui Campeã Mundial e na temporada de 2013/2014 fui morar na Itália e joguei durante uma temporada para a equipe Ternana, fui Vice campeã da Copa Itália e da liga Italiana. Agora estou no Brasil e fui recentemente convocada para a Seleção Brasileira de Futebol de Salão.
VC – Qual o projeto que mais te marcou até hoje e qual o título que tiveste mais prazer de conquistar?
Jessiquinha - Acho que cada título conquistado tem o seu valor e a sua importância, então seria difícil destacar um, cada conquista foi importante para mim sendo ela jogando como profissional ou como amador. O importante é lutar e jamais desistir,me dedico com muita garra e determinação e sem duvida nenhuma o que me mantém firme e forte são os fãs que me acompanham e acreditam no meu potencial, essa é a maior gratidão e retorno na modalidade, não tem sensação melhor do que comemorar um titulo depois de muita luta
VC – Conta-nos que “ninguém nos ouve” apenas nos lê ( risos ), qual é verdadeiramente o segredo do teu sucesso. Ouvi dizer que dizes que “quanto mais treinas mais sorte tens”.
Jessiquinha - Costumo dizer sempre que “Quanto mais eu treino, mais sorte eu tenho”. Escutei essa frase de uma pessoa que admiro muito. Explico isso de uma forma simples e rápida, nada supera o trabalho, a dedicação nos treinos, se resulta nos jogos, se eu treino bem, vou jogar bem e vice versa, essa é a filosofia que uso, ou seja quanto mais eu treino, mais chance de acertar no jogo terei. Para se ter bons resultados eu sigo regras, não tenho vícios, cuido da minha alimentação, durmo bem , sou dedicada, determinada e persistente em tudo que faço.
VC – Fala-nos um pouco das tuas experiências internacionais?
Jessiquinha - As minhas experiências internacionais foram com o Palmeiras Futsal (equipe brasileira), Ternana futsal (equipe Italiana), Seleção Brasileira Universitária e Seleção Brasileira.
Cada uma com o seu gostinho especial, e levarei cada uma delas para a minha vida toda!!!!
Com a equipe do Palmeiras fizemos um tour na Espanha disputando vários amistosos e torneios em diversas cidades diferentes, na qual recebi um troféu de melhor jogadora. Fomos para as seguintes cidades Logroño, Móstoles, Valladolid, Guitiriz, Ferrol e Madri.
Com a equipe italiana disputei a Copa Italia em Pescara e a Liga italiana na qual fui vice campeã de ambas.
Com a Seleção Universitária fui Campeã do Mundial Universitário em Novi Sad/Sérvia.
Com a Seleção Brasileira sou Bi Campeã Mundial e Tri Campeã do SulAmericano. Em Guayaquil/Equador foi disputado o II Sul-Americano, em Madri/Espanha foi disputado o I mundial e em Maracay/Venezuela foi disputado o IV Sul-Americano.
VC – Comparando o futsal à escala global, o que pensas da evolução do mesmo, e se conheceres fala-nos do futsal português.
Jessiquinha - O Futsal vem evoluindo bastante, hoje em dia os campeonatos estão sendo muito mais competitivos e isso é muito bom para a nossa modalidade. Assistir um jogo de futsal feminino está cada vez mais prazeroso, esse é o resultado que estamos crescendo independente da língua, cultura e pais, somos todos seres humanos lutando por um único objetivo (futsal melhor).
Sobre o Futsal Português é algo notório que vem crescendo bastante, vejo muitas portuguesas com grandes qualidades, coisa que no passado existia uma ou outra que se destacavam. Não é a toa que hoje a seleção portuguesa é considerada uma das melhores seleções do mundo.
VC – Conheces alguns jogadores do nosso país, nomeadamente o “Ricardinho”?
Jessiquinha - Conheço o Ricardinho somente dentro das quadras, é um jogador de muitas qualidades e não é a toa que foi considerado o melhor do mundo em 2010 e o ano anterior. Desejo muito mais sucesso e conquistas a esse grande craque!!!
VC – Tens preocupações com a formação dos atletas jovens, nomeadamente através do teu projeto das escolinhas de futsal. Fala-nos deste projeto e do que pretende atingir com ele?
Jessiquinha - Este projeto visa atender meninas moradoras de comunidades carentes e usar o Futsal como um meio de transformação social.
O nosso Futsal é Feminino, porque acreditamos num crescimento estruturado e ordenado desta modalidade no Brasil. Apesar de tantos preconceitos, temos trabalhado com seriedade e dedicação para que as mulheres conquistem um espaço de respeito e igualdade no futsal e no futebol, assim como ocorre em outros esportes.
O nosso Futsal também é Social porque mais do que ganhar uma partida de futebol, nós treinamos pesado para mudar o placar social do nosso país. A maioria dos levantamentos oficiais e estudos acadêmicos sobre pobreza têm revelado que as mulheres apresentam taxas mais elevadas nos termos de pobreza absoluta e relativa.
Acredita-se que 70% dos pobres no mundo são mulheres.
São muitos os fatores existentes que fazem com que as mulheres obtenham este triste índice, porém, é nelas que vemos a grande oportunidade de mudança.
É na mesma força que fazem as mulheres suportar e aguentar tanta desigualdade, que apostamos nelas para serem agentes desta tão sonhada mudança social. Pois uma grande parte do sistema da pobreza será quebrada quando as mulheres estiverem sendo bem tratadas e estruturadas para enfrentarem esta realidade.
Contamos hoje com cerca de 70 meninas, com idade de 9 a 17 anos. Elas estão divididas nos nossos dois núcleos de trabalho – Jardim Aeroporto (Congonhas, zona Sul de São Paulo) e Arsenal (Guarulhos/SP).
O que pretendemos oferecer as meninas com o Nosso trabalho:
Com aulas de futsal feminino;
Com aulas de inglês e reforço escolar;
Com acompanhamento familiar e escolar;
Com distribuição de cestas básicas;
Com palestras de orientação social, ética e saúde;
Com estudos bíblicos;
Com viagens e passeios culturais;
Com inserção no mercado de trabalho;
Com bolsas de estudos em Universidades, escolas particulares e cursos profissionalizantes;
Com realização de oficinas em outras comunidades;
E outras atividades que contribuem para a transformação integral de nossas meninas.
VC – Conta-nos uma história curiosa da tua carreira de futsalista?
Jessiquinha - Uma das curiosidades foi na infância, a realização de um campeonato interclasse que só jogavam meninos, eu de tanto insistir para jogar, o organizador do torneio me deixou entrar por alguns minutos, os meninos da minha classe adoraram pois fiz muitos golos, queriam que eu jogasse todos os jogos, mas os times adversários não queria aceitar, gerando uma polémica dentro da escola, depois de muita discussão fui autorizada a jogar até o final do campeonato onde fomos campeões e eu recebi o troféu de melhor jogadora, e no ano seguinte abriram o campeonato de futsal feminino que ocorre até hoje. Me faz muito feliz saber que diante da minha determinação o futsal feminino foi implantado anualmente nesta escola.
Outra curiosidade recente foi quando estava disputando o II Mundial realizado em Fortaleza, com uma foto minha tirada no Mundial uma fã me homenageou com uma tatuagem, isso foi algo surpreendente e que me deixou muito feliz.
VC – Estamos a terminar, foi um prazer conduzir esta entrevista, e desafio-te a deixares uma mensagem às jovens atletas portuguesas e aos nosso leitores da VC Futsal.
Jessiquinha - Jamais desista dos seus sonhos, trabalhe com determinação, garra, coragem e muita dedicação , acredite no seu potencial e jamais deixe de estudar, pois o futsal infelizmente é uma carreira muito curta, e lembre-se quanto mais eu treino mais sorte eu tenho.... Sucesso a todos.
Agradeço a oportunidade de estar participando desta entrevista, foi um grande prazer poder falar um pouco sobre minhas experiências e compartilhar com todos vocês.
Paulo Rosa editor VC Futsal

